O concurso World Press Photo anunciou nesta sexta-feira (16) que pôs em dúvida a autoria da imagem de “A Menina do Napalm”, uma das fotografias mais emblemáticas da história, após um documentário levantar dúvidas sobre quem realmente tirou a foto que mudou o curso da Guerra do Vietnã.
O documentário The Stringer, realizado por Bao Nguyen e exibido no Festival de Sundance em janeiro, atribui a imagem a Thanh Nghe, um colaborador vietnamita externo, e não ao fotógrafo da agência Associated Press, Huynh Cong Ut, conhecido como Nick Ut, 74, que foi premiado com o Pulitzer.
Em uma mensagem publicada no Facebook em fevereiro, Nick Ut reiterou que a imagem era de sua autoria. “Eu tirei a foto de Kim Phuc [nome da então menina que aparece nua], tirei as outras fotos daquele dia que mostravam a família dela e a devastação que a guerra causou. Ninguém mais tem o direito de afirmar que eu não tirei esta foto específica ou qualquer outra foto atribuída a mim, pois sou o criador de todo o meu trabalho desde o primeiro dia. Minha carreira se estende por mais de 50 anos. Embora eu esteja aposentado da AP, continuo a criar mensagens impactantes para o mundo ver.”
Neste post, Ut cita Carl Robinson, então editor de fotografia do escritório da AP em Saigon (atual Ho Chi Minh) e peça central no documentário que gerou a controvérsia. Robinson, hoje com 81 anos, diz no filme que seu chefe, o premiado fotógrafo de guerra alemão Horst Faas, lhe teria ordenado a atribuir o crédito da foto a Nick Ut. O editor não explica por que Haas teria tomado essa decisão, embora se especule que tenha sido para a imagem estar ligada a um funcionário da agência, não a um colaborador (stringer, no jargão da profissão). Haas morreu em 2012.
“Mais de 50 anos depois, não consigo entender por que Carl Robinson, funcionário da AP em Saigon naquela época, elaboraria essa história e diria que eu não tirei a icônica foto”, afirmou Ut em sua mensagem. Os advogados do fotógrafo vietnamita tentaram impedir que o documentário fosse exibido, sem sucesso. Robinson não se manifestou publicamente depois de ter sido questionado por Ut nas redes sociais.
Após o lançamento da obra, a AP investigou por quase um ano o que aconteceu em 8 de junho de 1972 na localidade de Trang Bang, no Vietnã, quando Kim Phuc Phan Thi, a menina que aparece correndo nua, queimada e chorando, foi capturada pela câmera enquanto fugia de um ataque com napalm junto com outras crianças. À época, ela tinha 9 anos.
Os pontos levantados pelo documentário provocaram “uma profunda reflexão dentro do World Press Photo”, que realizou uma investigação de janeiro a maio sobre a autoria da foto, informou o concurso em comunicado.
“Segundo uma análise do local, da distância e da câmera utilizada naquele dia, os fotógrafos Nguyen Thanh Nghe ou Huynh Cong Phuc talvez estivessem em posição melhor que Nick Ut para tirar a foto”, disse a organização.
No início deste mês, a AP anunciou que continuará atribuindo a autoria da icônica foto a Nick Ut, embora tenha admitido que sua própria investigação levantou “questões importantes que talvez nunca possamos responder”.
“Constatamos que é impossível demonstrar exatamente o que aconteceu naquele dia, na estrada ou no escritório, há mais de 50 anos”, declarou a AP nesta sexta-feira.
Kim Phuc, que obteve nacionalidade canadense, continuou dando seu testemunho ao longo da vida. Hoje com 62 anos, ela é embaixadora da Boa Vontade da Unesco.
O concurso World Press Photo ressaltou que a autenticidade da foto não está sendo questionada, tampouco o prêmio concedido. “É importante destacar que a foto em si é indiscutível e sem dúvida representa um momento histórico real que continua a ressoar no Vietnã, nos Estados Unidos e no mundo todo”, afirmou Joumana El Zein Khoury, diretora executiva do concurso.